html PUBLIC "-//W3C//DTD XHTML 1.0 Strict//EN" "http://www.w3.org/TR/xhtml1/DTD/xhtml1-strict.dtd"> QUOUSQUE TANDEM: March 2014

CRITICA SOCIAL E POLITICA

Sunday, March 30, 2014

Assunção Esteves, possidónia 

Assunção Esteves é uma personagem no sentido plano e caricatural do termo. Nos romances, as Assunções surgem nos capítulos secundários para dar um colorido sociológico ou histórico ao cenário onde a personagem principal actua. Ora, a nossa Assunção Esteves representa o colorido cómico de um certo Portugal, o Portugal da comédia snob, do nariz empinado por questões de nascimento. Sim, é o Portugal que brinca aos pobrezinhos, mas também é o Portugal que quer brincar aos riquinhos. Assunção Esteves encaixa na segunda espécie. Julgo que aqueles que brincam aos pobrezinhos têm uma palavra gira para descrever esta segunda categoria: possidónios. Palavra giríssima, sei lá.
A segunda figura do estado recusa admitir que o seu pai era alfaiate. Aquilo que devia ser motivo de orgulho é motivo de vergonha. Como é evidentíssimo, a filha de um pobrezinho não pode chegar ao topo, é contranatura. Apesar da origem humilde, Assunção Esteves aceitou o ethos pseudo-aristocrático da "Lesboa" que se repete em todas as povoações portuguesas com mais de, vá, 10 habitantes. E a mutação não se ficou por aqui. Segundo uma peça da Sábado, a Presidenta tem aquela obsessão típica pelo luxo. Ele é roupa de alta-costura, ele é carteiras que custam 10% da sua reforma (valor da pensão: 7200 euros por 10 anos de trabalho), ele é um corrupio de assessores que trata como escravos coloniais, ele é gastos sumptuários: assim que chegou à Presidência da Assembleia, Assunção Esteves mudou a casa de banho do seu gabinete para não usar a mesma retrete do antecessor. Que magno problema viu Assunção Esteves no bumbum de Jaime Gama?
Os regimes mudam, mas este Portugal não morre. A comédia social parece que tem o dom da imortalidade. Tal como em 1950, ainda temos fidalgos a viver em bolhas sem qualquer contacto com a realidade. E, tal como em 1950, ainda temos fidalgos wannabe que querem à força brincar aos riquinhos para depois brincarem aos pobrezinhos. País giríssimo, sei lá.

Henrique Raposo
In: Expresso

 

 

 



 

 

 

 

 




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Thursday, March 20, 2014

Almofada de pedra

 

por VIRIATO SOROMENHO MARQUES

Como é que designaríamos o comportamento de um cidadão que, incapaz de honrar um crédito pessoal a uma taxa de 3,35%, prestes a atingir a maturidade, contraísse um novo empréstimo a uma taxa de 5,11% para pagar o primeiro ("troca de dívida")? Sem dúvida, tratar-se-ia de um comportamento pouco recomendável. E como seria classificado esse comportamento se o cidadão em causa utilizasse parte do novo empréstimo (de 11-02-2014) para antecipar, parcialmente, o pagamento em 19,5 meses do primeiro empréstimo, pagando 102,89 euros por cada 100 euros de dívida ("recompra")? Seria, certamente, uma atitude temerária, pois aumenta a despesa com juros para apenas empurrar a dívida para o futuro. Pois é isso que o Governo pretende fazer hoje. O leitor pode ir ao site eletrónico do IGCP. Abra o boletim mensal de fevereiro sobre "Dívida Pública". Na p. 2, vê que o Estado vai ter de resolver até 2016 cerca de 39 mil milhões de euros de empréstimos. Esse imenso obstáculo tem sido o pretexto para a constituição de uma volumosa "almofada" financeira. Tudo indica que o IGCP quer recomprar, hoje, uma parte de uma série de dívida a dez anos, contraída a partir de outubro de 2005 (ver p. 3). Se o fizer, às taxas mais recentes no mercado secundário, isso significa que, para o montante que for hoje amortizado, vamos pagar mais 3,53% de juros por ano até outubro de 2015 do que antes das duas operações financeiras supracitadas. Será isto uma gestão prudente, ditada pelo interesse nacional, ou estará o Tesouro público em risco para alimentar uma ilusão pré-eleitoral de triunfo? Será esta uma almofada que alivia o País, ou uma pedra amarrada às pernas que o atira para o fundo? Temos direito a saber a lógica com que se joga o dinheiro sonegado aos salários e às pensões. Direito a uma explicação, ou a uma beliscadela que nos acorde deste pesadelo.
 

 

 




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